Quando se ouve Nine Inch Nails (NIИ) pela primeira vez é como se alguém nos tivesse dado um soco no estômago, tivéssemos uma arma apontada à cabeça e durante alguns minutos existisse uma película à frente dos nossos olhos que nos forçasse a ver desfocado e a não conseguir determinar tempo, espaço ou o que comemos ao pequeno-almoço. Quer se venere ou odeie, é impossível ser-se indiferente ao fenómeno Trent Reznor.
Reznor é um produtor, compositor, cantor e multi-instrumentista americano (dêem-lhe um desconto, o coitado não teve culpa de nascer na Pensilvânia) mais conhecido por ser o único membro oficial da banda de rock industrial, you’ve guessed it, Nine Inch Nails. Com os NIИ, Reznor não só levou o rock industrial às massas, como acrescentou um lado melódico e humano a um género que, como o próprio nome indica, se foca no mecânico. Usando apenas uma palavra para descrever NIИ – ou, para todos os efeitos, descrever o seu líder –, essa palavra seria sem dúvida exploração. Esta é uma preocupação visível em qualquer projecto de Reznor, onde existe uma constante sede pela descoberta de novos sons e pela oscilação entre uma panóplia de temas - sociopolíticos (de que são exemplos ‘Capital G’ e ‘The Hand That Feeds’), religiosos (‘Terrible Lie’), catarse emocional (‘Something I Can Never Have’) e agressividade pura (‘March of the Pigs).
Os seus álbuns são portanto sempre bastante conceptuais (s’faz favor de não confundir com a ‘conceptualidade’ da Lady Gaga) e nos concertos que faz com a banda acrescenta sempre elementos visuais e performances complexas que muitas vezes culminam na destruição dos instrumentos por parte dos integrantes.
NIИ - Capital G
Em 2009, Reznor decide afastar-se deste projecto para se dedicar a outros, entre eles ‘How to Destroy Angels’, com a sua mulher Mariqueen Maandig. Alia-se simultaneamente a Atticus Ross (com quem havia já trabalhado na produção de vários álbuns dos NIИ, a destacar ‘Ghosts I-IV’ lançado em 2008) para criar a banda sonora do filme ‘The Social Network’ de David Fincher, na segunda metade de 2010.
Este torna-se um momento importante na carreira de Reznor pois vem dar-lhe notoriedade e cimentá-lo como um dos melhores músicos e produtores da sua geração, não só dentro do universo musical, mas cinematográfico também, apresentando-o a um vasto público novo.
As músicas são aparentemente mais minimalistas e melódicas, quando as comparamos com o que Trent nos habituou com os NIИ, pois há um uso muito maior do piano e a ausência de voz é óbvia; no entanto, não só essa ausência é ilusória pois, na realidade, não retira mas só acrescenta carga emocional, como há aqui a continuação de uma ideia já transmitida com Nine Inch Nails – que é possível uma interacção frutífera entre a máquina e o homem, entre a tecnologia e a fragilidade humana. Há aqui tanto de simplicidade e fragilidade como de complexidade e agressividade – se numa música como ‘Hand Covers Bruise’ a ênfase está no piano e o que sentimos é vulnerabilidade, em ‘A Familiar Taste’ já o foco está nos riffs de guitarra eléctrica, na distorção e no caos.
Trent Reznor and Atticus Ross - A Familiar Taste
Músicas como ‘3:14 Every Night’ parecem mesmo despidas de qualquer tipo de carga emotiva, aparentando quase algo feito por máquinas para máquinas, mas que vem por isso mesmo acrescentar algo inovador e criativo.
Toda esta interacção entre o suave e o agressivo, entre o humano e tecnológico é algo que muitos não conseguem compreender, muito menos criar de forma interessante e inovadora, tenho que dar bastante crédito ao Treznor e ao Atticus Ross por isso. Segundo Reznor: ‘Musically, this all came out of our secret laboratory - electronic in basis, but mostly organic sounding. Lots of experiments and emphasis on sound fraying around the edges while focusing on the proper emotional tone for the various scenes.’
Não só cumpre o seu o seu objectivo de nos agarrar ao ecrã – aliado claro à genialidade de Fincher e ao fantástico desempenho de Jesse Eisenberg (que não podia ter um nome mais épico – cof cof só falta o H), - como vem, de facto acrescentar algo à nossa existência. Para mim não basta ver o filme, não basta ouvir esta compilação aliada às cenas que, é verdade, também lhe dão grande parte da carga emocional, mas é preciso também ir procurar somente a música e voltar a ouvi-la, de preferência à noite e num ambiente escuro (para efeito dramático).
Destaco ainda, ‘in Motion’, a música mais comprida da compilação e também uma das mais interessantes por ser o exemplo perfeito do que Reznor faz chegar até nós – sons fortemente electrónicos que facilmente despertam emoções.
Trent Reznor and Atticus Ross - In motion
Entretanto, o ‘mestre’ foi novamente convidado pelo realizador David Fincher para criar uma banda sonora, desta vez para o filme ‘The Girl With the Dragon Tattoo’, em 2011. Reznor e Atticus Ross deram-nos mais daquilo a que já estamos habituados, intercalando desta vez os seus originais com duas covers – sendo a mais pertinente a cover da ‘Immigrant Song’ dos Led Zeppelin, que estes adaptaram ao seu estilo mais mecânico e electrónico, tendo a colaboração de Karen O da banda ‘Yeah Yeah Yeahs’ na voz.
Karen O with Trent Reznor and Atticus Ross - Immigrant Song
Para finalizar a minha adoração pelo homem, deixo só um cheirinho ao álbum novo dos NIИ, projecto ao qual ele regressou em 2013 com o álbum ‘Hesitations Marks’. Alguns estavam cépticos ao regresso de Reznor, e sinceramente muitos foram os que ficaram desiludidos com o álbum, por ser um álbum mais melódico, até mais comercial que o habitual, resultado talvez de um bocadinho de falta de ambição, por falta da tal sede do novo som e dos novos temas a que ele mesmo nos habituou. Peca um pouco por isso, sem dúvida. No entanto a sua base electrónica e industrial está lá, assim como as opiniões fortes. Não é o seu melhor álbum, de todo, mas mesmo assim fica acima de muitos dos álbuns que apareceram por aí em 2013.
NIИ - All Time Low
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